terça-feira, 6 de dezembro de 2016

LAGOA SANTA

REGIÃO DO CARSTE DE LAGOA SANTA



Fotos: Rony Camargos e Mirian Cássia
Texto: Rony Camargos

Em visita aos municípios de Lagoa Santa, Pedro Leopoldo  e Matozinhos, tive contato com um dos acervos mais importantes da arqueologia brasileira.

Vista parcial da cidade de Lagoa Santa


A cidade de Lagoa Santa se orgulha de suas grutas, suas figuras rupestres, museus e a memória de Peter Lund.

Vale a pena relembrar alguns fatos do memorável naturalista dinamarquês.

Em 1825 chegou ao Brasil Peter Wilhelm Lund que viria a ser considerado o “pai da paleontologia brasileira”.

Peter Lund e seu fiel parceiro o desenhista norueguês Peter Andreas Brandt, que faria todo o registro do magnífico trabalho de escavações e estudos da região de Lagoa Santa.

Lund dedicou muito tempo em escavações próximas aos paredões rochosos nas imediações da lagoa do sumidouro, hoje localizada no Parque Estadual do Sumidouro em Pedro Leopoldo e Lagoa Santa.



Local onde foi enterrado Peter Lund. Neste tereno também está enterrado o desenhista Peter Brandt.

O Pequizeiro é centenário



A lagoa do sumidouro é um dos pontos de nascimento do Estado de Minas Gerais, a região foi ocupada por Fernão Dias Paes (1608-1681) ainda na época das bandeiras que desbravaram o sertão brasileiro que viria a se tornar a região das minas.  Nessa Região Fernão Dias instalou roças e fazendas para beneficiar mandioca, criar animais para suprir as bandeiras que vinham em busca do Sabarabuçu, a grande montanha brilhante ou resplandecente. E também da lagoa das esmeraldas, a vupabuçu.


Alguns estudiosos afirmam que foi nas imediações de Lagoa Santa que Fernão Dias teria mandado enforcar seu  filho bastardo, que se amotinou contra a ideia de se continuar com aquela bandeira.
Fernão Dias morreu sem encontrar suas esmeraldas, mas quase dois séculos depois Peter Lund encontrou outros tesouros.

Canoa feita em um único tronco ainda da época das bandeiras

Casa de Fernão Dias Paes.


O naturalista visitou mais de 800 cavernas na região central de Minas Gerais, nas grutas do Sumidouro, escavou e encontrou diversos esqueletos de homo Sapiens que passaram a ser denominados de “Homem de Lagoa Santa”, cujo exemplar mais famoso é o crânio de Luzia, encontrado no início dos anos 70 por uma missão Franco-brasileira liderada pela arqueóloga  francesa Annette Laming-Emperaire.

A lagoa do sumidouro, atualmente seca. Quando chove muito ele acumula água.



























Peter Lund e Peter Brandt acabaram se interessando também pelas inúmeras figuras rupestres encontradas na região. Embora a habilidade técnica de Brandt seja questionada por especialista, é certo que ele contribuiu enormemente com o registro do trabalho de Lund.

André Prous em texto publicado na revista In Situ informa que Brandt pintou um grande painel de figuras rupestres no sítio de Cerca Grande. E que segundo alguns estudiosos trata-se da primeira prancha colorida da edição.


A visita à região do carste de Lagoa Santa.

A região do carste abrange os municípios de Lagoa Santa, Pedro Leopoldo, Matozinhos, Funilândia e Confins compondo uma região de grande valor histórico e econômico.

Qualquer uma dessas cidades é uma boa opção para se basear para explorar as diversas grutas e abrigos da região, todas têm boa infraestrutura,  hotéis,  restaurantes e todas são muito agradáveis.

Optei por ficar desta primeira vez em Lagoa Santa, o acesso para o Parque Estadual  do Sumidouro é muito bom, uma estrada toda asfaltada em área urbanizada, distante cerca de 13 Km do centro da cidade.

Entrada da Gruta da Lapinha, aqui não há figuras rupestres


Detalhe do teto da gruta da Lapinha no Parque do Sumidouro


Detalhe de espeleotemas na gruta da Lapinha


O Museu Peter Lund localizado bem próximo à gruta da Lapinha é muito bonito, porém, decepciona um pouco pelo pequeno acervo.

Museu Peter Lund próximo a gruta da Lapinha

O Museu  de Arqueológico de Lagoa Santa é um achado. Trata-se de um museu construído em forma de um pequeno castelo medieval pelo arqueólogo amador Mihály Bányai

Atualmente o museu é administrado por sua Filha Érika Bányai  uma simpática e entusiasta historiadora que além de suas importantes informações serviu de guia para nossa visita à gruta da Vargem da Pedra e à fazenda Jaguara, antiga propriedade que chegou a ter 1.500 escravos e possui as ruínas de uma igreja projetada e decorada por Aleijadinho.


 O Museu do castelinho, como é chamado por muitos moradores da região, possui peças originais escavadas por Mihály Bányai e outros pesquisadores, esqueletos completos com mais de 10 mil anos. fósseis de répteis pré-históricos, mamíferos extintos e muitos líticos, machados, pontas de flechas, fusos, calibradores, pilões e muitas outras peças.

É um passeio imperdível, paga-se uma pequena taxa de 3,00 é permitido fotografar e pode-se bater um papo muito instrutivo com a Erika, que também reproduz algumas figuras rupestres da região e que são vendidas ali mesmo no museu. 


Museu Arqueológico de Lagoa Santa

Crânio coletado pelo arqueólogo Mihály Bányai na década de 70, datado de cerca de 12.000 anos







Fóssil de um Mesossauro encontrado no Brasil.

coleção de líticos encontrados na região

Machados em forma semi-lunar - cultura Aratu-Sapucaí 

rico acervo de vasos decorados e urnas funerárias




detalhe de ponta de flecha de pedra lascada (quartzo).



esqueleto original de um exemplar do "Homem de Lagoa Santa"

Urna funerária


Com a ajuda da lupa pode-se observar uma gota de um líquido preso no quartzo


A Vargem da Pedra.

Na região de Mocambeiro, no município de Matozinhos pode ser visitada a Vargem da Pedra, um imenso rochedo calcário com muitas figuras rupestres,

Estes sítios foram amplamente estudados por pesquisadores como André Prous, Walter Neves, Alenice Baeta entre outros importantes nomes da arqueologia e paleontologia.

As figuras rupestres de Lagoa Santa são tipicamente exemplares da tradição Planalto, encontra-se também elementos da tradição São Francisco e mesmo da tradição Nordeste, como observou a arqueóloga Alenice Baeta.

Rochedo da gruta da Vargem da Pedra em Mocambeiro - Matozinhos






Motivo ovóide com figuras antropomorfas próximas
(Não parece um peixe?)





Nesta foto, pode-se ver à esquerda do motivo principal, duas figuras antropomórficas.



Zoomorfo  representando provavelmente  um mamífero.

detalhe do zoomorfo em crayon preto - Tipico do estilo  Vargem da Pedra (In Situ nº 4)

Zoomorfos associados a figura antropomorfas- talvez representando uma cena de caça
Clicando nesta foto ela é ampliada, é possível  observar vária outras figuras mais esmaecidas, algumas parecem ser representações antropomorfas. as pequenas formações de ninhos de insetos (vespas) acabam por danificar muitos painéis rupestres. 










"As Pizzas" como são conhecidas essas figuras



Há quem veja representação de astros nessas figuras, talvez representação de frutas ou simples abstrações
o fato é que nunca saberemos o que representavam essas figuras para os povos que as fizeram.





Neste abrigo, o teto está coberto por fuligem. Talvez fuligem produzida por fogueiras pré-históricas?


Gruta do Sumidouro:

O Arqueólogo francês radicado no Brasil André Prous nos fala que os painéis de arte rupestre que vemos hoje é uma parcela do que foram um dia. Muitas cores foram deterioradas, outras foram encobertas por escorrimento calcário e casas de insetos. 

Paredões como estes abaixo, na gruta do Sumidouro dão uma ideia do quão magnifico deve ter sido estes painéis.

Para se chegar a este sítio, existe uma trilha que é feita somente  com a presença de guias. Não se pode aproximar muito das figuras, o visitante fica em uma passarela de madeira. Os guias são bem informados e capacitados para dar informações confiáveis.


um zoomorfo

Zoomorfos em vermelho e amarelo, aqui dá pra ver que figuras foram sobrepostas às outras












pedaços de cerâmicas encontradas a céu aberto




CAALE - CENTRO DE ARQUEOLOGIA ANNETTE L. EMPERAIRE

O nome do Museu é uma homenagem à arqeuóloga Francesa que na década de 70 desenvolveu pesquisas em Lagoa Santa e Região, foi ela que descobriu o crânio "de Luzia" com datação de 11.500 anos.

O museu hoje possui um belo acervo, inclusive com objetos na reserva técnica  da gruta do Gentio II de Unaí.










FAZENDA JAGUARA

A fazenda teve início em princípios do século XVIII, se tornou uma das maiores fazendas da região das minas.

A fazenda chegou a ter um forte com canhões apontados para o rio das Velhas, que próximo a 1730 era uma rota para desvio do ouro minerado na região. A fazenda chegou a possuir cerca de 1.500 escravos trabalhando em seus campos.

Pertenceu por um tempo ao engenheiro Henrique Santos Dumont pai de Alberto Santos Dumont.
Posteriormente passou a pertencer a um minerador inglês, que por ser de religião Anglicana, não deu o devido valor ao templo católico ali construído. Parte da decoração interna de Igreja de Nossa Senhora da Jaguara foi encaminhado para a Matriz de Nova Lima.

Ruínas da igreja da Fazenda Jaguara 

Todo o projeto arquitetônico e  decorativo desta igreja foi feito e executado pelo mestre Aleijadinho

A igreja foi abandonada quando a fazenda foi adquirida por um minerador Inglês em meados do século XX.



GRUTA REI DO MATO E A GRUTINHA.

A  gruta Rei do Mato atualmente faz parte de uma Unidade de Conservação Estadual, bem cuidada e com boa estrutura para receber os turistas. As visitas são guiadas, o número de visitantes por grupo é controlado e não é permitido a utilização de tripés para fazer as fotos.

Próximo à Gruta Rei do Mato, há uma pequena gruta chamada de "grutinha" que possui algumas figuras rupestres, classificada como sendo da Tradição Planalto. Foram encontrados na Grutinha um bom número de instrumentos de pedras, segundo o site do IEEF-MG as pinturas datam de cerca de 6.000 anos.



Interior da gruta Rei do Mato em Sete Lagoas.

Conjunto de estalactites, estalagmites e colunas, muitas foram depredadas antes da criação do parque.

Estalagmites gigantescas crescendo em direção ao teto.

Abaixo, figuras rupestres da Grutinha, um abrigo próximo à entrada da Gruta do Rei do Mato.

Figura rupestre depredada, representação de  cena sexual, talvez um ritual de fertilidade.

As figuras na parte de cima do painel representam peixes. Há a sobreposição de figuras rupestres e infelizmente rabiscos feitos por espécimes dos "homo stupidus"

Um cervídeo pintado no teto da gruta em uma área escura.



Outro cervídeo pode ser identificado nesta figura



Note um zoomorfo, um cervídeo? pintado em amarelo, sobrepondo figuras em vermelho




Representação feminina no teto da caverna


REFERÊNCIAS:

REVISTA IN SITU NºS. 02, 03, 04

ARTE PRÉ-HISTÓRICA DO BRASIL - ANDRÉ PROUS, BELO HORIZONTE 2007 - Didática

Agradecimentos à

ROSÂNGELA ALBANO - ARQUEÓLOGA DO CAALE

CLEITO PINTO RIBIERO - HISTORIADOR - CAALE

ÉRIKA SUZANNA  BÁNYAI HISTORIADORA - MUSEU ARQUEOLÓGICO DA LAPINHA

EQUIPE DO MUSEU PETER LUND.

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